"Deuce, que tinha medo de fantasmas, vivia esperando a hora em que
Webb o encontraria. Em sonhos que em nada diferiam da sua juventude
desgraçada, ele largava Lake no meio da noite, saía gritando pelas
trevas inexploradas nas profundezas de celeiros mal-assombrados,
desafiando o que quer que estivesse ali a sair no espaço aberto, o qual
por si só se tornara malévolo. Ficava esperando até o mais fundo da
noite sem relógio por montanhas com quilômetros de altura que só saíam à
noite, esperando a hora de conduzir uma
carroça sem dono morro acima até chegar a um cemitério outonal e ser
encontrado pelo homem que ele matara. Mosquitos do tamanho de animais
domésticos, com olhos tão reencarnados e expressivos quanto os de um
cão, e corpos quentes e bons de apertar como coelhos, esbarravam nele
lentamente...
Por vezes
Deuce tinha a impressão de que havia enfiado a cabeça num cômodo muito
pequeno, pouco maior do que uma cabeça humana, sem eco, fechado,
silencioso... 'É... quem sabe', ele mal conseguia ouvir sua própria voz,
'eu seria capaz de sair por aí matando um monte de pessoas? E aí eu não
ia me sentir desse jeito por causa daquela única morte...'."
Thomas Pynchon (1937-). Contra o dia (2006). São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 483
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