"Quanto tempo a gente perde na vida? Se somarmos todos os minutos
jogados fora, perdemos anos inteiros. Depois de nascer, a gente demora
pra falar, demora pra caminhar, aí mais tarde demora pra entender certas
coisas, demora pra dar o braço a torcer. Viramos adolescentes teimosos e
dramáticos. Levamos um século para aceitar o fim de uma relação, e
outro século para abrir a guarda para um novo amor, e já adultos
demoramos para dizer a alguém o que sentimos, demoramos para perdoar
um amigo, demoramos para tomar uma decisão. Até que um dia a gente faz
aniversário. 37 anos. Ou 41. Talvez 48. Uma idade qualquer que esteja no
meio do trajeto. E a gente descobre que o tempo não pode continuar
sendo desperdiçado. Fazendo uma analogia com o futebol, é como se a
gente estivesse com o jogo empatado no segundo tempo e ainda se desse ao
luxo de atrasar a bola pro goleiro ou fazer tabelas desnecessárias. Que
esbanjamento. Não falta muito pro jogo acabar. É preciso encontrar logo
o caminho do gol. [...]
Pessoas experientes já não cozinham em fogo brando, não esperam
sentados, não ficam dando voltas e voltas, não necessitam percorrer
todos os estágios. Queimam etapas. Não desperdiçam mais nada.
Uma pessoa é sempre bruta com você? Não é preciso conviver com ela.
O cara está enrolando muito? Beije-o primeiro.
A resposta do emprego ainda não veio? Procure outro enquanto espera.
Paciência só para o que importa de verdade. Paciência para ver a tarde
cair. Paciência para sorver um cálice de vinho. Paciência para a música e
para os livros. Paciência para escutar um amigo. Paciência para aquilo
que vale nossa dedicação. Pra enrolação, atalho."
Martha Medeiros (1961-). Coisas da vida. Porto Alegre: L&PM, 2010, p. 215-216
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