sexta-feira, 24 de julho de 2015

um mero engenheiro

"Quantas horas as pessoas gastam no trajeto para o trabalho no dia a dia? Tsukuru tenta mensurar. Em média uma hora a uma hora e meia só para ir, ele calcula. Quando um assalariado comum que trabalha no centro de Tóquio, casado e com um ou dois filhos, deseja comprar uma casa, inevitavelmente precisa ser no 'subúrbio', e isso o faz levar esse tempo nos deslocamentos. Nas vinte e quatro horas do dia, cerca de duas a três horas são gastas 'somente' no ato de se locomover em função do trabalho. No trem lotado, se a pessoa tiver sorte talvez consiga ler um jornal ou um livro de bolso. Talvez seja até possível estudar espanhol ou ouvir a sinfonia de Haydn no iPod. Dependendo da pessoa, talvez consiga ficar absorta em longas especulações metafísicas, de olhos fechados. Mas, em geral, deve ser difícil considerar que essas duas ou três horas do dia sejam o momento mais valioso e de melhor qualidade da vida de cada um. Quantas horas da vida são tomadas em função da locomoção (provavelmente) sem sentido e desaparecem? Em que medida esse tempo esgota e desgasta as pessoas?

Mas esse não é um problema com que Tsukuru Tazaki, que trabalha em uma companhia ferroviária e lida principalmente com o projeto de estações, deva se preocupar. Cada pessoa deve cuidar da sua vida. Afinal, a vida é 'delas', e não de Tsukuru Tazaki. Cada pessoa deve julgar individualmente quanto a sociedade em que vive é feliz ou infeliz. O que ele precisa pensar é apenas em como guiar de forma adequada e segura o fluxo de certo número de pessoas. Não são exigidas dele reflexões. Só lhe é exigida eficácia. Ele não é um pensador nem um sociólogo, mas um mero engenheiro."

Haruki Murakami (1949-). O incolor Tsukuru Tazaki e seus anos de peregrinação. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014, p. 309-310

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