sexta-feira, 24 de julho de 2015

O incolor Tsukuru Tazaki



"Deveria ter morrido naquele momento, Tsukuru Tazaki costuma pensar. Assim, este mundo que existe aqui e agora não existiria mais. Isso lhe parece fascinante. O fato de não existir o mundo do agora, o fato de não ser mais real o que aqui é considerado realidade. O fato de que, assim como ele não existiria mais neste mundo, este mundo também não existiria mais para ele.

Mas, ao mesmo tempo, Tsukuru não compreendeu de verdade por que nessa época precisou chegar tão perto da morte, até o extremo. Havia sim uma razão concreta, mas por que o fascínio pela morte era tão intenso, a ponto de envolvê-lo por cerca de seis meses? Envolver: sim, essa é a palavra apropriada. Como o personagem bíblico que foi engolido por uma enorme baleia e sobreviveu na barriga dela, Tsukuru caiu no estômago da morte e passou dias sem ver o tempo passar, dentro de um vazio escuro e estagnado.

Ele viveu esse período como um sonâmbulo, ou como um defunto que ainda não se deu conta de que está morto. Acordava quando o sol se erguia, escovava os dentes, vestia a roupa que encontrava por perto, pegava o trem para ir à faculdade e anotava as aulas. (...) ele apenas agia seguindo o cronograma à sua frente. Não falava com ninguém a não ser que fosse necessário e, quando voltava para o apartamento onde morava sozinho, ele se sentava no chão, encostava-se à parede e pensava sobre a morte ou a ausência da vida. À sua frente um abismo escuro abria a boca grande que dava diretamente ao centro da Terra. Lá se via o vazio que revolteava na forma de duras nuvens e se ouvia um profundo silêncio que comprimia os tímpanos."

Haruki Murakami (1949-). O incolor Tsukuru Tazaki e seus anos de peregrinação. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014, p. 7-8

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