"Ela nunca... nunca viu que Marlon Brando se percebia tão agudamente
enquanto corpo que 'não precisava' de modos. Ela nunca viu que daquele
jeito entre aspas descuidado ele na verdade tocava de fato tudo que
tocava como se fosse parte dele. Do seu próprio corpo. O mundo que ele
só parecia tratar com rispidez era para ele uma entidade dotada de
sentidos, sensibilidade. E ninguém... e ela nunca entendeu isso. (...).
Ela nunca viu que o Brando estava jogando o equivalente de uma
boa partida de tênis de alto nível em estúdios de costa a costa, Jim,
era o que ele estava fazendo de verdade. Jim, ele se mexia que nem um
alevino descuidado, um grande músculo, musculosamente naïf, mas sempre,
veja bem, um alevino no centro de uma corrente límpida. Aquele tipo de
graça animal. O filho da mãe não desperdiçava 'um' gesto, era isso que
fazia aquilo virar arte, esse des-cuidado abrutalhado. O lema dele era o
de um tenista: toque as coisas com consideração e elas serão suas; você
vai mandar nelas; elas vão se mexer ou ficar paradas ou se mexer pra
você; elas vão se recostar e abrir as pernas e entregar as suas suturas
mais íntimas a você. Vão te ensinar todos os truques que elas conhecem.
Ele sabia o que os beatniks sabem e o que o grande jogador de tênis
sabe, filho: aprenda a fazer nada, com a tua cabeça inteira e com o
corpo, e tudo vai ser feito pelo que está em volta de você. Eu sei que
você não está entendendo. Ainda. Eu conheço essa cara boquiaberta. Eu
sei muitíssimo bem o que isso quer dizer, filho. Não faz mal. Você vai
entender. Jim, o que eu sei eu sei."
David Foster Wallace (1962-2008). Graça infinita (1996). São Paulo: Companhia das Letras, 2014, p. 163
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