"Gately vive sentindo uma terrível noção de perda, narcoticamente
falando, de manhã, ainda, mesmo depois de tanto tempo limpo. O padrinho
dele lá no Grupo Bandeira Branca diz que tem gente que nunca se recupera
da perda daquilo que eles achavam que era o seu único melhor amigo e
amante; eles simplesmente têm que rezar diariamente pedindo aceitação e
colhões de aço pra seguir adiante e passar pela dor e pela perda, pra
esperar até que o tempo endureça bem a casca da ferida. O padrinho,
Francis Furibundo G., não enche nem por um átimo o saco de Gately por
ele sentir uns sentimentos negativos sobre isso tudo: pelo contrário,
ele elogia Gately pela sua sinceridade ao desmontar e chorar que nem um
bebê e falar tudo numa manhã bem cedo no telefone público, da sensação
de perda. É um mito isso de que ninguém sente falta. Da Substância
particular de cada um. Caralho, você não ia precisar de ajuda se não
sentisse falta."
David Foster Wallace (1962-2008). Graça infinita (1996). São Paulo: Companhia das Letras, 2014, p. 280-1
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