"Estive em Londres e soube que o escritor Alain de Botton está
fazendo um certo barulho com sua mais nova empreitada cultural. Não é um
novo livro, é algo mais ambicioso: um curso de ideias para se viver
melhor, ou seja, para se aprender a lidar com o cotidiano de uma forma
mais prática e inventiva. Contrapondo-se às escolas tradicionais, que
ensinam coisas que, na maioria das vezes, jamais nos serão úteis, ele
está implantando a sua The School of Life na capital inglesa.
O
projeto é meio 'odara', mas interessante. A Escola da Vida procura
educar para a existência, para o aqui e agora, privilegiando lições mais
excitantes do que as que aprendemos sobre ácidos nucleicos ou química
orgânica. Com arte, filosofia e bom humor, Alain de Botton montou uma
equipe para ajudar os alunos a encontrarem respostas para perguntas tipo
'Preciso mesmo de um relacionamento amoroso?', 'Como aproveitar de
forma mais inteligente e criativa o meu tempo livre?', 'Odeio meu
trabalho: e agora?', 'De onde saem nossos conceitos sobre política?',
'Dá para extrair mais proveito de visitas a museus, cinemas e teatros?',
'Como conviver com o medo da morte?', 'Será que minha família é tão
estranha como as outras?'.
Resumido dessa forma, dá ares de
charlatanismo, mas quem conhece os livros de Alain de Botton (pelas
minhas contas, há sete lançados no Brasil) sabe que ele é mestre em
misturar todos os departamentos (viagens, amores, arquitetura: tudo tem a
ver com tudo) e que se ampara nas obras de famosos intelectuais para
explicar e valorizar o mundano. Enfim, ele encontrou um nicho e o está
explorando com muito senso de oportunidade, porque estamos vivendo uma
época em que ter um diploma, uma carreira e uma família bonitinha não
tem bastado para preencher nossas almas inquietas. Queremos mais prazer,
mais independência, mais beleza. Em que colégio se aprende isso, em que
faculdade? Se você não tem talento para ser um autodidata, Alain de
Botton convida a sentar num banco escolar e ter como professores Proust,
Baudelaire, Churchill, Lao-Tse e mais uma turma da pesada, todos
dispostos a desanuviar a sua mente.
Estive na pequena loja que
ele abriu nos arredores da Russel Square, onde se pode encontrar
cartazes que ilustram o espírito do projeto, informações sobre os cursos
e, principalmente, vários livros que fazem parte da 'biblioterapia' que
a The School of Life propõe – vive melhor quem lê a respeito das
questões que lhe afligem, e não se trata aqui de livros de auto-ajuda, e
sim romances de ficção, ensaios filosóficos, biografias. Isso tudo pode
ser apenas uma jogada de autopromoção, mas eu simpatizei com a ideia,
porque acredito mesmo que estamos precisando de um reforço
extracurricular.
Para se formar um ser humano, não adianta apenas
ensinar física, biologia, história, matemática e demais matérias
convencionais. Precisamos também ser especialistas em viajar, em se
relacionar melhor, em consumir cultura, em ter uma visão menos ortodoxa
de tudo o que nos cerca. O material é farto e os resultados podem ser
aplicados no dia-a-dia. Bem viver também faz parte da educação."
Martha Medeiros. A escola da vida. In: Feliz por nada. Porto Alegre: L&PM, 6ª edição, 2011, p. 21.
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