"Está anoitecendo e escrevo sentada numa cabine de carro-leito, enquanto do outro lado da janela se sucedem vilas humildes, cemitérios de automóveis, hortas, fábricas, desmanches, depósitos de lixo e ferro-velho e esses grupos de barracos que vão se deslocando cada dia até mais longe, espalhando-se como os lábios de uma chaga, à medida que os especuladores com suas escavadeiras fazem a miséria da periferia bater em retirada, como se quisessem negar-lhe a existência e afastá-la de sua vista. O sol se pôs justo quando o trem ia deixando a estação de Atocha, mas sobre as nuvens escurecidas ainda restam alguns brilhos alaranjados."
Carmen Martín Gaite (1925-2000). Nebulosidade variável (1992). São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 48
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