"— Minha casa é em lugar nenhum — prosseguiu ele. — Não sou de copas,
nem de ouros, nem de paus, nem de espadas. Também não sou rei ou
valete, nem oito, nem ás. Aqui estou eu, um simples curinga. E tive de
descobrir sozinho o que é ser um curinga. Toda vez que mexo a cabeça,
meus guizos tilintam e me lembram de que não tenho família, de que sou
sozinho. Não tenho um número nem um ofício. Não domino a arte de soprar
vidro dos anões de ouros, nem a arte da panificação dos anões
de copas; a mim me faltam as mãos habilidosas para lidar com a terra,
como as dos anões de paus, e também a força muscular dos anões de
espadas. Assim, tudo o que sempre fiz foi andar por aí observando tudo o
que os outros faziam. Em contrapartida, pude ver um monte de coisas
para as quais todos os outros sempre foram cegos."
Jostein Gaarder (1952-). O dia do curinga (1990). São Paulo: Companhia das Letras
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