"...o tesão de viver só é possível ser alcançado se a vivência
biológica e espiritual da pessoa pende mais, proporcionalmente, para o
lado do prazer. Mas ninguém pode estar sentindo prazer por qualquer
coisa se não sentir também, e ao mesmo tempo, alguma dor no contato ou
vivência com o oposto do que nos causa prazer. Portanto, colocar o prato
da balança com mais peso no sentido do prazer nos obriga a fazer uma
opção ideológica e, em seguida, uma ação política que nos leve à rejeição
do que nos causa qualquer forma de dor e, simultaneamente, a opção pela
vivência mais plena do que nos provoca prazer. Estou querendo dizer que
o gosto do prazer só é identificável (e isso é exclusivamente
individual) se já sentimos o gosto da dor, que corresponde à vivência da
experiência oposta do que nos provocou prazer. O contrário também é
verdade. Exemplo: se eu não odiar as pessoas, não poderei amar ninguém;
se eu não for odiado por algumas pessoas, não poderei ser amado por
ninguém. Ou ainda, em outra instância: se eu não trabalhei, sofrendo e
me frustrando em coisas contrárias à minha vocação, não poderei avaliar a
totalidade do prazer que significa poder criar e produzir de acordo com
meus potenciais humanos originais. Claro, embora sejam muito raras,
existem algumas pessoas sortudas, aquelas que só conhecem o mel e o sal
da existência, não tendo tido nunca necessidade de fazer o que não gosta
e conviver com quem não ama."
Roberto Freire (1927-2008). Sem tesão não há solução. São Paulo: Trigrama, 1990, p. 61
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