sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Os aventureiros do absoluto



Tsvetaeva recusa sem hesitar o dualismo da arte e da vida. No entanto, mesmo que superando essa separação, opõe céu e terra, interior e exterior, ser e existir, imortalidade e vida – dualismo bem mais antigo, já que provém não da revolução romântica, mas daquela dos monoteístas, que opõem o Deus infinito ao mundo finito. Embaixo, portanto, a existência cotidiana (byt) odiosa, pois consagrada à simples sobrevivência: dia após dia, devemos, por nós e pelos outros (sobretudo quando se é mulher e mãe), nos levantar, procurar água para beber, alimento para comer, lenha para se aquecer, devemos passear com os filhos, dar-lhes banho, cuidar deles quando ficam doentes. Tudo isso é a “materialidade não transfigurada”, um rochedo que é preciso recomeçar a escalar todos os dias. É o que os outros chamam de vida. Portanto, Tsvetaeva não ama a vida nesse sentido restrito da palavra, não tem êxito nesse tipo de vida. “Não amo a vida terrestre, jamais a amei.” “Não sei viver aqui embaixo.” “Não posso viver, isto é, durar, eu não sei viver os dias, cada dia.”

Na falta de habitar essa vida, Tsvetaeva se refugia em outra, preferindo o interior ao exterior, o ser, à existência, o céu, à terra. “Amo o céu e os anjos: lá em cima e com eles eu saberia como proceder.” No outro mundo, no alto, ela atingirá o júbilo; no reino da Alma ela será a primeira, no juízo final do verbo, a justiça lhe será feita. Esse outro mundo, mais concretamente, se chama vida interior, ou ainda alma. Tsvetaeva tem que se resignar a ater-se a ele: habitá-lo é sua “doença incurável”. (...) “Ela não existe, a vida que teria suportado minha presença.” Mais exatamente, é da própria impossibilidade de viver feliz nessa vida que Tsvetaeva deduz a necessidade de uma realidade superior: “A vida me acua cada vez mais (profundamente) para o interior. (...) Viver não me dá prazer e essa rejeição me faz concluir muito claramente que outra coisa existe no mundo. (Manifestamente, a imortalidade)”.

Tzvetan Todorov. A Beleza salvará o Mundo (Wilde, Rilke e Tsvetaeva: os aventureiros do absoluto). Rio de Janeiro: Difel, 2011. p. 193-4

Um comentário:

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