segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

As Aventuras da Virtude

(...) a república nascida da derrota dos jacobinos era, do ponto de vista político, um regime anêmico e dividido. Na ausência dos grandes homens que haviam criado o extraordinário movimento de ideias do século XVIII e que tinham contribuído para a convergência dos ideais ilumistas da filosofia de Rousseau, das lições da Revolução Americana e das energias liberadas pela Revolução na França, sobrou um país dividido, com um Exército poderoso e uma classe política incapaz. A república do ano III já nasceu condenada ao fracasso. Em que pesem a generosidade e a lucidez de Madame de Staël, e até mesmo de Benjamin Constant, faltavam ao regime republicano a força dos ideais e a determinação das instituições. A forma sonhada por muitos estava lá, mas vazia dos conteúdos que haviam sido atribuídos a ela nos sonhos e projetos de tantos homens e mulheres ao longo das décadas anteriores. Naquelas circunstâncias, era uma república impossível, fadada a perecer sob o peso da história que havia presidido seu nascimento. Mas o fracasso republicano, o fechamento do longo e frutuoso período de constituição do republicanismo francês, foi também o momento inaugural de uma herança que até hoje é um dos pilares da cultura democrática e republicana da modernidade. Pouco importa se o século XIX será uma longa luta pela consolidação de muitos dos ideais formulados ao longo do século XVIII. O nascimento de uma matriz republicana francesa foi a criação de uma nova forma de ver e fazer política, a qual será decisiva para os caminhos e aventuras que marcaram as nações que, a partir de então, se confrontaram com o sonho e as dificuldades de se construir um regime baseado na liberdade, na igualdade e na fraternidade.

Newton Bignotto, As Aventuras da Virtude: As ideias republicanas na França do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 366-7.

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