terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Confissão

"– Quanto tempo passou desde a sua última confissão, meu filho?
– Muito tempo, padre.
– Um mês, meu filho?
– Mais, padre.
– Três meses, meu filho?
– Mais, padre.
– Seis meses?
– Oito meses, padre.
Havia começado. O padre perguntou:
– E o que você recorda desde então?
Começou a confessar os pecados: missas perdidas, orações não feitas, mentiras.
– Mais alguma coisa, meu filho?
Pecados de raiva, de inveja dos outros, de gula, de vaidade, de desobediência.
– Mais alguma coisa, meu filho?
– Preguiça.
– Mais alguma coisa, meu filho?
Não havia como escapar. Ele murmurou:
– Eu... cometi pecados de impureza, padre.
O padre não virou a cabeça.
– Sozinho, meu filho?
– E... com outras pessoas.
– Mulheres, meu filho?
– Sim, padre.
– Eram mulheres casadas, meu filho?
Ele não sabia. Os pecados pingaram-lhe dos lábios um por um, pingaram em gotas vergonhosas daquela alma que supurava e escorria como úlcera, um sórdido fluxo de vício. Os pecados escorreram, vagarosos, imundos. Ainda havia o que contar. Ele baixou a cabeça, vencido."

James Joyce (1882-1941). Retrato do artista quando jovem (1916). Porto Alegre: L&PM, 2014, p. 175-6

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