sábado, 17 de outubro de 2015

felicidade

"naquela tarde tinha tocado o requiem do mozart naquela casa e a maria da graça tinha a sensação de que tal fúnebre ato era como o erguer de um radar para as almas mais delicadas. quem por ali passasse e escutasse tão tristes melodias haveria de estar à porta da morte. o senhor ferreira a matar até os desconhecidos, incapaz de perdoar ao mundo a morte do pai e a ideia tão capitalista da felicidade.
a felicidade, disse-lhe, é posta diante de nós como uma extremidade do dinheiro. levantou-se, abriu a janela e ela levantou-se também seguindo de pés descalços para o seu lado. (...) a felicidade, pensava ela, não sei o que é. sei que não somos umas máquinas sem paragem. não podemos estar para aqui a trabalhar enquanto nos pedem que passemos da cera do chão para a partilha das memórias mais difíceis da vida."
Valter Hugo Mãe (1971-). o apocalipse dos trabalhadores (2008). São Paulo: Cosac Naify, 2013, p. 145-6

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