quarta-feira, 5 de março de 2014

Poesia marginal


"A brasa do cigarro não perturba o teu sono
Nem o resfolegar surdo da cidade
Não perturbam o teu sono o relógio
E os bêbados na rua
Penso em tirar do silêncio
A coragem para não te acordar"

João Carlos Pádua (1950-2009)
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"Lá onde vais é a tua sorte

é tu
de olhos arregalados:

onde estalam as estrelas
de ver para sempre."

Eudoro Augusto (1943-)
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"não ato
nem desato
desa
r
t
iculo"

Chacal (1951-)
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"...quando a luz do sol vai entrando de novo
dividindo o quarto num tratado de tordesilhas
eu nervoso me olho no espelho
me jogo no sofá me vejo cortado
em duas pontas
penso em você anjo louco
na sua força diabólica
maior Q a força do afrika korps
chego ao terraço – vejo o rio de janeiro
estou de saco cheio – olho a babilônia dos pobres
olho a cidade com a maldição dos renegados
com a glória neurótica do anjo exterminador
fumo uma maconha ligo a vitrola
telefono aos amigos
tomo um conhaque toco todos os sambas-canções
Q conheço de Nelson Gonçalves
procuro entender esse dia rompendo
todos os laços de família
querendo Q os insetos
invadam a casa e destruam as mobílias
sinto no lombo
cem anos de solidão
naufragando no negror da babaquice
MAS TUDO SE MOVE!..."

Adauto de Souza Santos (1950-)

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"Vou tentar a desistência
vou sentar aqui
ficar sem ir
e esperar por mim que vem atrás

os frutos caem
o carro corre
o poeta morre
o mundo marcha para sua manhã
e a sinfonia não pára

– sendo fatalidade, fico aqui –
se em tudo existe a própria máquina
pouco acrescenta ir ou não ir
...
eu vou parar
que venha a noite

se vier com luz
amém

se vier escura
amém

se vier mulher
bem, aí muito bem."

José Carlos Capinan (1941-)


Heloísa Buarque de Hollanda. 26 poetas hoje (1ª edição: 1975). Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007

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