soníferos eu lanço contra as feras
que me devoram a solidez do sono.
a solidão em si não me apavora.
os outros são o inferno, o purgatório
e às vezes são também o paraíso.
não sei do inverno que virá ou não
virá, ainda não formei juízo.
aliás, juízo sempre me faltou
e há de faltar, espero, até a morte,
esse capítulo da história natural,
contra o qual não farei rebelião.
amparo metafísico? não tenho.
invejo o céu, a dança das esferas,
morro de inveja do Ptolomeu,
vagando a salvo nas cosmologias
com Deus no centro, o resto ao seu redor.
não tenho centro, cetro ou direção.
a mim só não me falta coração
Geraldo Carneiro (1952-). Poemas reunidos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010. p. 162
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