Ninguém morre antes da hora. O que deixais de tempo não era mais vosso do que o tempo que se passou antes do vosso nascimento; e tampouco vos importa. Termine a vossa vida quando terminar, ela aí está inteira. A utilidade do viver não está no espaço de tempo, está no uso. Uma pessoa viveu longo tempo e no entanto pouco viveu; atentai para isso enquanto estais aqui. Terdes vivido o bastante depende da vossa vontade, não do número de anos. Pensáveis nunca chegar aonde estáveis indo incessantemente? E no entanto não há caminho que não tenha o seu fim. E, se a companhia vos pode consolar, não vai o mundo no mesmo passo em que ides? Todas as coisas seguir-vos-ão na morte (Lucrécio). Tudo não dança a vossa dança? Há coisa que não envelheça convosco? Mil homens, mil animais e mil outras criaturas morrem nesse mesmo instante em que morreis: Pois nunca a noite sucedeu ao dia, nem a aurora à noite, sem ouvir, mesclados aos vagidos da criança, os gritos de dor que acompanham a morte e os negros funerais (Lucrécio).
Michel de Montaigne (1533-1592), Ensaios
Um comentário:
Flávio, Michel Eyquem sr. de Montaigne é um grande filósofo, não sei porque sua obra não é explorada como a de outros. Talvez o seu ceticismo, enfim, mesmo assim considero-o um grande filósofo.
Recordo-me, principalmente porque escreveste algo sobre o assunto há algum tempo atrás, uma passagem de Montaigne sobre a desigualdade entre os homens. Em determinado momento ele diz que julgamos aquele que colocamos seus bustos em pedestais, porque somamos-lhes ao seu tamanho os dos pedestais sobre os quais estão.
Em outro momento, cita a observação de Antígono que estava farto da bajulação de seus seguidores, chamando-o de filho do Sol, e debocha deles: "quem limpa a minha retrete bem sabe que não é verdade".
Como a obra de Montaigne é muito vasta não me lembro mais citações no momento, mas, por certo encontrarás grandes reflexões nos Ensaios.
Abraços,
Joandre
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