"Pesa-me, aliás, toda a ideia
de ser forçado a um contacto com outrem. Um simples convite para jantar com um
amigo me produz uma angústia difícil de definir. A ideia de uma obrigação
social qualquer - ir a um enterro, tratar junto de alguém de uma coisa do escritório, ir esperar à estação uma pessoa
qualquer, conhecida ou desconhecida -, só essa ideia me estorva os pensamentos
de um dia, e às vezes é desde a mesma véspera que me preocupo, e durmo mal, e o
caso real, quando se dá, é absolutamente insignificante, não justifica nada; e
o caso repete-se e eu não aprendo nunca a aprender." (p. 79)
"E assim sou, fútil e sensível, capaz de impulsos violentos e absorventes, maus e bons, nobres e vis, mas nunca de um sentimento que subsista, nunca de uma emoção que continue, e entre para a substância da alma. Tudo em mim é a tendência para ser a seguir outra coisa; uma impaciência da alma consigo mesma, como com uma criança inoportuna; um desassossego sempre crescente e sempre igual." (p. 49)
"Uma inquietação enorme fazia-me estremecer os gestos mínimos. Tive receio de endoidecer, não de loucura, mas de ali mesmo. O meu corpo era um grito latente. O meu coração batia como se falasse". (p. 127)
"A posse é para meu pensar uma lagoa absurda - muito grande, muito escura, muito pouco profunda. Parece funda a água porque é falsa de suja." (p. 450)
Fernando Pessoa (1888-1935)
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