terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A velhice do poeta

Década de 70:

Depois de se separar de Cristina Gurjão, uma longa viagem à Europa é vivida como uma iniciação. Vinicius, já acompanhado de Gesse Gessy, parte para uma temporada de rupturas que são tomadas como sinais de decadência, de isolamento tido como esquisitice, de revitalização vista como decrepitude. Nenhum desses enganos o impressiona, nem o faz mudar seu rumo. Vinicius desarruma todos os clichês a respeito da arte de envelhecer. Serenidade, introspecção, ponderação, equilíbrio, prudência, bom senso, enfim, atributos clássicos de um envelhecimento saudável, não o seduzem. Mais do que nunca, ele deseja agarrar a vida, enfrentá-la, e isso significa optar pelo inesperado, pelo estranho, pelo descabido. Isso choca - e muitos amigos conservadores se melindram. Gesse é estranha, aquele menino magrelo chamado Toquinho, montado num violão e posto ao seu lado, é estranhíssimo, aquela nova vida metida numa bata branca e envolvida por cordões místicos, sessões espíritas no candomblé de Mãe Menininha, a companhia de garotos mal saídos da adolescência, shows em diretórios acadêmicos perseguidos pela ditadura militar, e descaso, quase desprezo pela poesia erudita, tudo isso é extravagante e muito, muito estranho. Mas é justamente estranhamento, surpresa, espanto que ele passa a desejar.

José Castello, Vinicius de Moraes: o poeta da Paixão. Uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 1994, p. 320-21.

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