sexta-feira, 21 de maio de 2010

Uma reunião de médicos na Idade Média

O interrogatório foi interrompido pela chegada da comida, galinha grelhada muito passada com nabos assados, e cerveja que Rob bebeu com cuidado, pois não queria fazer papel de tolo. Depois do jantar foi informado que Bruce faria a palestra naquela noite. Falou sobre ventosas, aconselhando os colegas a aquecer convenientemente as ventosas de vidro, pois era o calor que puxava os venenos do sangue para a superfície da pele, onde podiam ser eliminados por meio da sangria.

- Devem demonstrar aos pacientes sua confiança na cura com aplicações repetidas de ventosas e sangrias para que compartilhem do seu otimismo - recomendava Bruce.

A palestra foi mal preparada, e pelas conversas Rob chegou à conclusão de que quando tinha onze anos aprendera mais com Barber sobre ventosas e sangrias do que aqueles médicos sabiam.

Assim, o Liceu foi um desapontamento.

Pareciam obcecados com preços de consultas e rendas pessoais. Rufus chegou a brincar com o presidente da mesa, médico do rei, chamado Dryfield, dizendo que o invejava por receber pagamento anual e roupas de médico.

- É possível conseguir um ordenado sem servir ao rei - interrompeu Rob.

Agora todas as atenções voltaram-se para ele.

- Como isso pode acontecer? - perguntou Dryfield.

- O médico pode trabalhar num hospital, um centro de cura dedicado ao tratamento e ao estudo das doenças.

Alguns olharam para ele sem compreender, mas Dryfield assentiu com um gesto.

- Uma ideia do Oriente que começa a tomar vulto. Ouvi falar de um hospital recém-instalado em Salerno, e há muito tempo existe o Hôtel Dieu, em Paris. Mas prestem atenção, os doentes são mandados para o Hôtel Dieu para morrer e esquecidos, e é um lugar infernal.

- Hospitais não precisam ser como o Hôtel Dieu - disse Rob, sentindo não poder falar sobre o maristan.

Mas Hunne interrompeu.

- Talvez o sistema funcione para as raças inferiores, mas os médicos ingleses têm espírito mais independente e devem ter liberdade para conduzir seus negócios.

- Sem dúvida a medicina é mais do que um negócio - observou Rob delicadamente.

- É menos que um negócio - retrucou Hunne -, com o preço das consultas e com os borra-botas inexperientes que estão sempre chegando a Londres [referindo-se a Rob]. Por que acha que é mais do que um negócio?

- É uma vocação, Master Hunne -, como o chamado divino para os homens da igreja.

Brace deu uma gargalhada. Mas o presidente da mesa tossiu, farto da discussão.

Noah Gordon, O Físico: a epopéia de um médico medieval. Rio de Janeiro: Rocco, 1988, p. 559-560.

Obs: A semelhança com os tempos atuais é mera coincidência.

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