domingo, 26 de outubro de 2008

Antes que o diabo saiba que você está morto

FILME SENSACIONAL! CONFIRA.

Direção: Sidney Lumet. Com: Philip Seymour Hoffman, Ethan Hawke, Albert Finney e Marisa Tomei.

"Possa você ter comida e prosperidade, uma almofada macia para sua cabeça, possa você estar 40 anos no céu, antes que o diabo saiba que você morreu!"

sábado, 25 de outubro de 2008

Sobre importâncias


Um fotógrafo-artista me disse uma vez: veja que o pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar.

Falou mais: que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balança nem com barômetro etc.

Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.

Assim um passarinho nas mãos de uma criança é mais importante para ela do que a Cordilheira dos Andes.

Que um osso é mais importante para o cachorro do que uma pedra de diamante.

E um dente de macaco da era terciária é mais importante para os arqueólogos do que a Torre Eiffel. (veja que só um dente de macaco!)

Que uma boneca de trapos que abre e fecha os olhinhos azuis nas mãos de uma criança é mais importante para ela do que o Empire State Building.

Que o cu de uma formiga é mais importante para o poeta do que uma Usina Nuclear. Sem precisar medir o ânus da formiga.

Que o canto das águas e das rãs nas pedras é mais importante para os músicos do que os ruídos dos motores da Formula 1.

Há um desagero em mim de aceitar essas medidas.

Porém não sei se isso é um defeito do olho ou da razão.

Se é defeito da alma ou do corpo.

Se fizerem algum exame mental em mim por tais julgamentos, vão encontrar que eu gosto mais de conversar sobre restos de comida com as moscas do que com homens doutos.

Manoel de Barros

sábado, 18 de outubro de 2008

domingo, 12 de outubro de 2008

Apenas uma vez

Filme apaixonante. Vale a pena ver e rever.

Clarice

"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro".

"Mas nem sempre é necessário tornar-se forte. Temos que respeitar nossas fraquezas. Então, são lágrimas suaves, de uma tristeza legítima à qual temos direito. Elas correm devagar e quando passam pelos lábios sente-se aquele gosto pouco salgado, produto de nossa dor mais profunda".

Clarice Lispector (1925-1977)


Le Journal

C’est très intéressant le journal, n’est-ce pas? C’est vraiment une petite psychothérapie. On y organise notre image, on y essaie d’encadrer notre vie, notre monde, d’arranger les choses, comme on fait avec nos cheveux et notre face devant un miroir. C’est très intéressant; mais les récits dans un journal, surtout dans le mien, ne peuvent pas être confondus avec la réalité. La réalité est autre chose. Le fait réel, on ne peut pas le toucher. A partir du moment qu’on voit quelque chose se passer ou qu’on fait quelque chose, le réel disparaît, parce que il y aura toujours un filtre entre le fait et les yeux. Dans un journal la réalité est filtrée, parce que ce qu’on écrit est simplement une représentation de la réalité. On fait ça pour organiser tout, pour rendre notre vie plus supportable.

Belo Horizonte, Le 17 avril 2000

domingo, 5 de outubro de 2008

Ocorrência

Cheguei ao sobrado na rua da Cancela e o guarda que estava na porta disse: primeiro andar. Ele está no banheiro.

Subi. Na sala uma mulher com os olhos vermelhos me olhou em silêncio. Ao seu lado um menino magro, meio encolhido, de boca aberta, respirando com dificuldade.

O banheiro? Ela me apontou um corredor escuro. A casa cheirava a mofo, como se os encanamentos estivessem vazando no interior das paredes. De algum lugar vinha um odor de cebola e alho fritos.

A porta do banheiro estava entreaberta. O homem estava lá.

Voltei para a sala. Já havia feito todas as perguntas à mulher quando o perito Azevedo chegou.

No banheiro, eu disse.

Anoitecia. Acendi a luz da sala. Azevedo me pediu ajuda. Fomos para o banheiro.

Levanta o corpo, disse o perito, para eu soltar o laço. Segurei o morto pela barriga. Da sua boca saiu um gemido.

Ar preso, disse Azevedo, esquisito não é? Rimos sem prazer. Pusemos o corpo no chão úmido. Um homem franzino, e barba por fazer, o rosto cinzento, parecia um boneco de cera.

Ele não deixou bilhete, nada, eu disse.

Eu conheço esse tipo, disse Azevedo, quando não agüentam mais eles se matam depressa, tem que ser depressa senão se arrependem.

Azevedo urinou no vaso sanitário. Depois lavou as mãos na pia e enxugou-as nas fraldas de sua camisa.


Rubem Fonseca. O Cobrador.