E depois, uma vez, em meados dos anos sessenta, no outono, quando jonathan foi à agência dos correios na Rue Dupin e quase tropeçou numa garrafa de vinho na entrada, colocada em cima do pedacinho de papelão, entre uma bolsa de plástico e a boina bem conhecida com algumas moedas dentro, e quando procurou, sem querer, o clochard [mendigo] durante alguns momentos, não porque estivesse sentindo sua falta como pessoa, mas sim porque faltava o ponto central da natureza-morta composta de garrafa, bolsa e papelão..., então Jonathan o viu agachado entre dois carros estacionados do outro lado da rua e viu como ele fazia suas necessidades: o clochard agachara-se ao lado do meio-fio, com as calças arriadas até os joelhos, o traseiro virado na direção de Jonathan, as nádegas totalmente desnudas, os transeuntes passavam, todos podiam vê-lo: um traseiro branco-farinha, com manchas azuis e lugares com crostas avermelhadas, de aparência tão esfolada como as nádegas de um ancião mantido num leito - em contrapartida, o homem não era mais velho do que Jonathan nessa época, tinha talvez trinta, no máximo trinta e cinco anos de idade. E desse traseiro esfolado saiu então um jorro de líquido marrom, caindo no calçamento com tremenda violência e em grande quantidade, formando um charco, um mar que circundou os sapatos, e os salpicos lançados para cima e para os lados mancharam meias, coxas, calças, camisa, tudo...
Patrick Süskind, A Pomba. Rio de Janeiro: Record, 1987, p. 59-60.
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